" Segura Coração! "

As Casadas Solteiras – por Tania Brandão






Com extrema alegria, o Grupo de Teatro " Os Multiplicatores " recebe a notícia das críticas do Grande Festival Martins Pena de Teatro Amador sobre " As Casadas Solteiras". O grupo ficou feliz por apresentar um trabalho com extremo esforço e absorveu a todas as críticas para em um próximo trabalho ser melhor que o anterior.

Abaixo, crítica feita por Tânia Brandão:


O poder é das mulheres
(AS CASADAS SOLTEIRAS, Grupo Os Multiplicadores)
Tânia Brandão
Os homens brasileiros não sabem de nada: o poder feminino no Brasil, ao contrário do que afirmam, não é fato recente, data do século XIX. E quem reconhece a condição é o primeiro autor dramático estimado da terra, Martins Pena, neste texto precioso de 1845, As casadas solteiras. Nele, há um recurso tradicional do autor, a tessitura de duas tramas paralelas. Ao lado do painel da sociedade, o olhar para os hábitos e costumes do tempo, há um enredo voltado para as peripécias de duas irmãs, que escapam do poder do pai autoritário para casar seguindo as suas vontades. Ainda que o projeto afetivo libertário não surja muito bem sucedido, elas, no final, conseguem dobrar a dupla autoridade masculina que insiste em subjugá-las, a do pai e a dos maridos ingleses, para ficar com estes, que passam a aceitar as leis impostas em casa pelo sexo frágil. Há ainda a figura da amiga confidente, que anda caçando o marido rebelde, também submisso no desfecho, ainda que o empobrecimento súbito tenha sido decisivo para a sua rendição.
O texto seria uma imitação de um original francês, não identificado, situação que não contamina a comédia de forma palpável, pois a sintonia com os maneirismos brasileiros é total. A ação tem um tom muito característico do autor: começa na Ilha de Paquetá, ao ar livre, na popular festa de São Roque, passa para cenas de interior na Bahia e no Rio. A composição da época se faz de maneira direta, portanto, em um painel dinâmico. E recebeu tradução cênica, no espetáculo, bastante interessante. Através de um ardiloso telão e alguns poucos elementos praticáveis, móveis, o grupo conseguiu sugerir claramente este clima geral, condição favorecida por figurinos que chegam a ser ricos no universo do amadorismo. Cenários e figurinos (Antonio Barbosa) garantem a existência de uma cena bela de ver.
E a beleza acontece também em boa parte graças à direção (Marcelo de Freitas), inteligente e espirituosa, inclinada a enfrentar o texto e a valorizar o desafio da linguagem teatral proposta, ainda que nem sempre o elenco jovem consiga expor com desenvoltura as formas coloquiais distantes dos modos correntes hoje. Mas nada é tão grave que chegue  a impedir uma divertida visita ao século XIX.
Destaca-se no conjunto, com extrema força, por sua composição, capacidade de dominar os ritmos e as possibilidades do cômico, o jovem Marco Giovani, responsável por um hilariante Bolinbrock. A sua atuação encontra eco e apoio no sempre correto Cássio Braga (John), um coadjuvante precioso. O Jeremias de Léo Tone, apesar do colorido pernóstico e da curiosa petulância, própria dos brasileiros folgados, tropeça nas palavras em alguns momentos. As duas irmãs rebeldes (Guta Soares e Fernanda Ramalho) respondem bem às necessidades de liderança cênica, ainda que revelem menos brilho e altivez do que o necessário para impor o perfil das duas sinhazinhas arrogantes. Já a confidente Henriqueta (Maísa Rocha) hesita, deixa de traduzir a liderança e a ferocidade da esposa largada. Os demais componentes da equipe revelam uma imaturidade técnica mais forte. Em suma, um bom trabalho.
Talvez a encenação lucrasse com um tom mais agudo de ironia e de acidez, pois, ao lado da trama sentimental, da discussão do fato de casar ou não, por amor, com estrangeiros, e da validade ou não da união com forasteiros de outra religião, acontecia uma trama histórico-político escandalosa, o casamento submisso da economia brasileira com o avassalador capital inglês. O que significa reconhecer que, então, uma outra mulher mandava e desmandava em todo o País – e seu nome era Inglaterra.

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